“Como já escrevi anteriormente, considero que a eleição de 2016 redesenhou o quadro político da cidade da seguinte forma: 1) A vitória de Raquel deu sobrevida aos Lyra na política da cidade e abriu espaço para uma ruptura geracional; 2) Marcou o declínio das demais forças políticas tradicionais da cidade e; 3) Permitiu a entrada de uma nova força política na arena eleitoral.
É sobre esta nova força política que pretendo falar hoje. O desempenho do delegado Lessa em 2016 foi algo surpreendente. Pela primeira vez em décadas (muitas décadas) uma figura não alinhada a nenhum grupo político tradicional da cidade ganhou espaço do debate público e chegou a ser uma ameaça real na eleição de 2016. A primeira reflexão (e a mais óbvia) é de que isso foi fruto de uma conjuntura.
Todos os processos eleitorais se desenrolam dentro de um cenário que chamamos de conjuntura. Essa conjuntura, por sua vez, nasce de movimentos políticos (das instituições políticas e das forças políticas) que impactam o comportamento dos eleitores. Portanto, mudanças de regras eleitorais, desempenho dos governos em políticas públicas, alianças político-partidárias e etc. Todos estes elementos desenham as conjunturas na política.
A conjuntura da eleição de 2016 foi marcada por dois aspectos: o primeiro foi o cenário nacional com o impeachment de Dilma e o discurso anticorrupção que estava em seu auge. E o segundo, pelo cenário local marcado pelo fracasso da política de segurança pública na cidade. A ascensão política de figuras ligadas à polícia tem sido um fenômeno nacional e em Caruaru foi potencializada por este quadro. Foi dessa conjuntura que o delegado Lessa surgiu e ganhou força.
A falta de atenção do Governo do Estado com a segurança pública aliada à inércia das forças políticas locais criou o espaço para o surgimento de uma figura com discurso de xerife. O delegado Lessa se apresentou como a solução para o problema da segurança pública, mesmo sabendo que o município teria pouquíssimas ferramentas para lidar com a questão. No entanto, o fato é que esta conjuntura não se repetirá mais.
Em 2017, logo após o susto causado pela chegada de Lessa, os grupos políticos tradicionais se acotovelaram para cobrar do governador do estado a criação do BIEsp. E esse movimento alterou o quadro da segurança pública da cidade, ampliando a sensação de segurança e desmontando a plataforma que fez o delegado Lessa ganhar projeção.
Em 2020 o grande problema é a saúde. A pandemia do coronavírus alterou todo o cenário e o debate das eleições deve girar em torno da gestão da pandemia e dos impactos econômicos gerados pelo isolamento social. Abertura e fechamento do comércio, número de mortes, testagens, UTI na rede municipal e outros temas correlatos serão o foco este ano.
O que se coloca como enigma para esta eleição é qual será a plataforma que o delegado Lessa pretende apresentar. A segurança pública perdeu o protagonismo para a gestão da saúde e o delegado vai precisar sair de sua área de maior domínio para atingir uma massa maior de eleitores. Ao mesmo tempo, se sua plataforma se associar ao discurso mais conservador e religioso, é provável que restrinja ainda mais o seu potencial eleitoral.”
Vanuccio Pimentel
Doutor em Ciência Política
Professor da ASCES-UNITA